sexta-feira, 3 de julho de 2009

O Grande Desastre Aéreo

O grande desastre aéreo
Sitônio Pinto

Há uma palavra e um tema proibidos na propaganda das empresas de aviação: « segurança ». Essa palavra e esse tema são tabus, pois despertam reações negativas nos usuários de viagens aéreas. Até os anos cinqüentas (50’s) os anúncios das empresas aéreas ainda abordavem esse tema, mas se descobriu que seu tratamento exacerbava o temor dos viajantes potenciais - ou impotentes. E se baniu a palavra dos textos. O approach passou a ser dirigido para conforto, pontualidade, glamour, serviço de bordo, preço etc. Qualquer assunto, menos segurança.
Há uma convenção internacional que proibe a divulgação das gravações dos diálogos proferidos nas cabines dos aviões sinistrados, com a mesma preocupação que censurou a palavra « segurança » na propaganda das empresas aéreas : não provocar pânico no mercado consumidor. Recordem-se os casos ainda recentes de dois jatos sinistrados no Brasil : o da Gol (Boeing, em 02-10-2006) e o da TAM (Airbus, em 18-07-2007). O primeiro colidiu com um avião Legacy (Embraer) nos céus de Mato Grosso; o segundo percorreu toda a pista na aterrissagem, chocando-se com um depósito da Gol para incendiar-se em seguida, no aeroporto de Cumbica, São Paulo. As caixas-pretas registraram os diálogos desesperados dos tripulantes nas cabines, do qual o público só tomou conhecimento de algumas partes. Mesmo assim, as autoridades brasileiras do setor aéreo foram criticadas por organismos internacionais, pela divulagação daquelas derradeiras conversas, inda que parciais.
Há um desinteresse sintomático, por parte da imprensa francesa, na cobertura do caso do vôo 447 da rota Rio-Paris, desabado este mês no litoral brasileiro. Há duas grandes empresas francesas envolvidas na tragédia : a Airbus, construtora do avião sinistrado, e a Air France, operadora do vôo. Vejam só o « lead » com que L’Express de ontem abriu a notícia : Selon la presse brésilienne, l'enquête sur le crash du vol AF447 avance. L'examen des 16 premiers corps [...]. « Segundo a imprensa brasileira », diz o jornal. Assim disse a imprensa francesa outras vezes em que tratou o assunto. Outras vezes nem trata, como o Le Monde de ontem e de outras edições. E assim calou a imprensa francesa noutros dias, com os corpos das vítimas ainda a boiar no mar.
Por que acontecem desastres aéreos ? Em grande parte, por conta da ganância de lucros das empresas do setor. Quanto mais rápido voar um avião, mais passageiros o mesmo aparelho e a mesma tripulação levam, otimizando os custos. Essa velocidade final arrasta a velocidade mínima para cima, fazendo com que um jato de pasageiros tenha que aterrizar a 250 kmh. Com a tragédia do vôo Rio-Paris, a Airbus recomendou aos pilotos de seus aparelhos que não vôem a menos de 500 kmh, para não desestabilizar o avião. Por que as pistas de pouso são curtas ? Para não onerar os custos dos aeroportos. Por que os vôs transoceânicos não são feitos em aviões anfíbios ? Porque os hidroaviões são mais caros de fazer e de operar. Por que os combustíveis são inflamáveis, quando o diesel puro não o é ? Porque os motores a óleo são mais lentos. Por que tanta pressa? Porque essa urgência não é dos passageiros, mas das companhias aéreas em ganhar dinheiro. Na tragédia de Cumbica, cobraram das vítimas as passagens vendidas a crédito para o vôo da morte. Até a rota do vôo AF 447 é um atalho que desconsidera a perigosa zona de turbulência que provocou a tragédia.