terça-feira, 13 de novembro de 2007

Os filhos de Franco

— Por que não se cala? — perguntou a Europa a América.
Há meio milênio a Europa tenta calar a América. Nesse ínterim, exterminou três grandes civilizações — Asteca, Maia, Inca. Queimou todos os seus escritos, degolou os seus sábios, exterminou milhares de povos.
A ordem do rei da Espanha, Juan Carlos I, ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez, é um procedimento antigo. O rei não disse nada de novo ao presidente. Apenas repetiu a postura arrogante do invasor, exterminador, escravizador e colonizador europeu diante dos habitantes do continente amarelo que teimavam sobreviver.
O continente que os europeus chamavam de novo, e que batizaram de “América” na pia dos degolados, era habitado de norte a sul por milhares de povos do estoque racial amarelo, desde há muitos milhares de anos. Mas a Europa disse a si mesma que “descobriu”, ou que “achou” um continente à deriva no mar e no tempo.
Sob as bênçãos do papa e da cruz, os povos do continente amarelo foram exterminados para ceder seu espaço à Europa expansionista. Os sobreviventes foram escravizados, suas mulheres apresadas para fazerem mestiços. E as línguas — milhares de línguas — receberam a ordem de calar-se, extintas e reduzidas ao silêncio.
O incidente em comento aconteceu na recente XVII Cúpula Ibero-Americana, realizada semana passada em Santigo do Chile, entre 8 e 10 deste novembro de 2007. O encontro reuniu 22 nações, representadas por seus enviados. A Espanha compareceu com força total: o ministro de Assuntos Exteriores, Miguel Ángel Moratinos, o presidente do governo, José Luiz Rodrigues Zapatero, e o rei Juan Carlos de Borbón Y Borbón.
O presidente do governo espanhol não gostou que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, qualificasse o ex-presidente da Espanha, José Maria Aznar, de “fascista”. Ora, o mundo todo sabe que o atual reino da Espanha foi uma recriação do caudilhíssimo Franco, o fascista que, apoiado por Hitler e Mussolini, logrou extinguir a república espanhola e impor ao povo espanhol uma ditadura de meio século, a que se seguiu o atual “reino”.
Ora, é publico e notório que o caudilhíssimo Franco chamou a si a guarda do menino Juan Carlos e criou o futuro rei, educando-o ao seu estilo. O príncipe Juan Carlos formou-se nas três academias militares de Espanha — da marinha, da força aérea e do exército. No juízo do caudilhíssimo, estava, assim, apto a governar as espanhas. E foi com essa educação que o bi-Borbón brandiu a mão a voz para o presidente da Venezuela, sublinhando o gesto do presidente espanhol que viera em defesa do ex-presidente Aznar, rotulado de fascista por Chávez. — o presidente eleito pelo povo venezuelano que sobreviveu à invasão, ao extermínio, à colonização e à escravização espanhola.
O presidente Zapatero exigiu mais respeito da parte do presidente Chávez, lembrando-lhe que Aznar fora eleito pelo povo espanhol. Mas o rei nem deixou o presidente Chávez responder à colocação do presidente Zapatero, ordenando: “Por que não se cala?”
Os embaixadores espanhóis extrapolaram as regras de uma assembléia, quando falaram em dueto, nas vozes de seu presidente e de seu rei. Foi como se o rei não considerasse bastante a delegação de seu presidente. Quer dizer: a Espanha falou com as vozes de dois chefes de estado, simultânea e orquestradamente. Fica a pergunta: quem governa a Espanha, quem a representa, o presidente do governo ou o rei de Franco?
Mas a voz do povo americano não será silenciada pelo vil garrote espanhol, fascista e franquista.

13.11.2007